terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Quando Só os Pontos Não Bastam


Entre o final dos anos 70 e o início dos anos 80, o boom das editorias policiais, já observado na mídia impressa algum tempo antes, tomou conta das emissoras de televisão. Programas como "Aqui e Agora", da Rede Tupi, e "O Povo na TV", da recém-criada TVS, apresentavam reportagens ambientadas em regiões miseráveis dos subúrbios cariocas e da baixada fluminense. Naqueles tempos, nem tudo o que ia para a editoria policial era caso de polícia. Fatos bizarros relacionados à falta de condições elementares para a sobrevivência brotavam em grande quantidade das páginas de "O Dia", "A Notícia" e "O Povo", além dos programas já citados e das rádios AM, eternos tambores do mundo-cão. Não se trata de expor um histórico sobre a baixaria na televisão. Hoje, estou aqui para criticar a abordagem dada pelo programa de televisão apresentado no vídeo acima. Apresentando a fórmula desgastada e judicialmente condenada do velho "Ratinho Livre", a produção exibe um raro caso médico: o de uma moça de 28 anos que, devido à disfunções da glândula tireóide, tem idade física e mental de um bebê de oito meses. Prestar auxílio à famílias que vivem abaixo da linha da miséria, sem comida, emprego, saúde, educação e saneamento básico é salutar. Porém, expor ao ridículo uma família como é feito só escarnece os verdadeiros interesses do programa: além dos tradicionais pontos de audiência, restritos à Fortaleza e receptores de antenas parabólicas pelo Brasil afora, marcar presença e chamar a atenção no Youtube. É exatamente para não corroborar com esta baixaria que não mencionarei aqui o nome do apresentador, programa e emissora em que ele é exibido. Trata-se apenas de uma nota de repúdio a mais este desrespeito ao doente no Brasil, medido dos pés à cabeça e exposto como uma simples curiosidade médica, tal qual os circos oitocentistas faziam na Europa e os circos televisivos novecentistas faziam no Brasil. Pensei que a moda houvesse acabado.

domingo, 25 de janeiro de 2009

Revista da Semmana

Adeus, sete complicados
Sete de perigo, Sete de implicância
Sete de temor, e até de esperança
Sete onde quase tudo deu errado

Sete onde só não errou quem estava certo
Absolutamente certo, indubitavelmente certo
Certo de que o certo é o de sempre
A mesma escolha de mais de um ano atrás

Sete de ameaças, Sete de trapaças
Sete onde até a morte se fez ameaçar
Sete onde a vida por dois dias chegou a parar
Sete quando o resto não queria esperar

Mas sete, mais sete, de certezas infindas
De que, entre tantas escolhas, eu fiz a mais linda
A escolha mais bela e mais companheira
A escolha de sete bons e sete maus pela vida inteira

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Antrophofales paternae

E o medo da vida, temos tanto por quê? E o que há de se temer quando, esquina cruzada, as visões são sempre as mesmas? Mesmo quando interpelados por interjeições grosseiras de alguém, seguimos em frente com os mesmos problemas e os mesmos objetivos de todos. Agora mesmo: já é mais de meia-noite de uma sexta para um sábado, e eu estou com um copo d'água na mão e um par de chinelões que era do meu avô nos pés. O mesmo par que meu pai usa quando esquece os dele por aí. As tiras de couro, a sola enrijecida, porém confortável, o couro... cheiro de couro velho! Daqueles que os antigos usavam nos pés, nos punhos, nas cinturas e até nos cintos de castidade. Desde os tempos clássicos! Quiçá, desde os tempos imemoriais! As sandálias de couro, tal qual essa moda grega que ainda por aí nas vitrines das lojas femininas, se tornaram um símbolo de que tudo é sempre a mesma coisa. A Vera Fischer atrás de 'homens interessantes' nas novelas das oito, o José Alencar internado, o Paulo Maluf se lançando candidato, o Túlio fazendo gols e o meu pai reclamando. De tudo. Do Lula, do Sérgio Cabral, do Brasil e do Mundo. Já sobrou para o Obama. Meu sogro, é outro. Sempre as mesmas queixas. E sempre as mesmas sandálias de couro nos pés. Quer saber? Sandálias de couro atraem comportamento ranzinza. Entra ano, sai ano, as queixas e o couro são sempre os mesmos. A diferença é uma só: quanto mais o ano passa, mais sem cor e mais fedorento fica o couro... Até que a lata do lixo nos separe! E sou suspeito para falar: adoro sandálias e coisas de couro. Reforçam o ar mais velho que eu sempre tive. De uns tempos pra cá, chegam a me passar um verniz de aposentado. Aos vinte e um. Sou o único rapaz de vinte e um, ao menos que eu conheça, que usa sandálias de couro. É o meu passaporte para ser tão igual quanto todos os que vieram antes de mim o foram, e graças a Deus! Ser igual ao que se fez com correção é sempre o mais adeqüado. Ainda que muitas vezes me digam que sou um velho em uma carcaça jovem, retruco com decisão: é melhor ser o sapato velho de sempre do que a moda de cada dia. E, definitivamente, ser o mesmo sempre é - ao menos, e se serve de consolo - garantia de bom caráter e coerência com nossos propósitos.

sábado, 17 de janeiro de 2009

Reflexões Acerca do Tédio

Nada preenche tanto quanto a falta do que fazer. Quando ela vem, alguns se trancam no banheiro e desejam as cunhadas. Outros, vão para a frente do monitor zapear por portais de notícias e de humor. O resto se fecha em uma redoma formada por seus próprios corpos, em busca de algo que faça o tempo passar mais depressa e elimine aos poucos o incômodo causado pela impressão de nada estar sendo feito. Uma forma ineficaz de se obter este fim é deitar e dormir. Minha mulher sempre faz isso. Dormir não produz muito, a menos que você seja um bom compositor com um bloquinho na mesa de cabeceira. E, além do mais, dormir neste calor insuportável é tarefa reservada para situações de absoluta necessidade. Já repararam o quanto as oito, nove, dez horas em que permanecemos na cama passam rápido? Os sonhos que parecem durar uma fração de segundo, se passam ao longo de quase uma hora. É um mundo paralelo onde um mês cabe nestas poucas horas, mas ao fim das contas, são o que são: nuvens de sonhos. A grande verdade é que o tédio torna imperiosa uma decisão: a de não perder mais tempo. As férias têm trinta dias por conta disso. Acima destes trinta, por mais divertidos que sejam os passeios e atividades, tudo se torna um grande e pesado fardo, o qual não vemos a hora de chegar ao fim. Decidi neste início de ano não perder mais tempo. Tenho uns dez ou quinze anos para definir a minha vida e a de Isabela de forma definitiva, já que planejo fazer poucas mudanças depois disto. Detesto mudanças, elas me entediam. Só o que não me entendia, paradoxalmente, é pensar nos mesmos objetivos e batucar os mesmos planos na madeira da mesinha, como se metas se tornassem melodias, e sonhos se tornassem uma dessas composições que surgem das caixinhas de fósforo dos sambistas. Faça como eu, não perca mais tempo. Tempo hoje é especiaria.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Registro, São Paulo. 1º de janeiro de 2009.

Trancado no escuro
Sozinho no mundo
Seis horas distante de ti

Se a noite é agora
Espero outra hora
Pra ver o meu tempo passar

Você nessa festa
É só o que resta
Pra minha saudade que infesta

Seis horas distante
Sem ver teu semblante
Sem ter a certeza, enfim...

Será que na noite saudades encontram
O brilho dos doces cristais?
Será que essa noite seis horas distante
É cedo ou tarde demais?