sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Niilismo

Volto a tentar, nunca cessei, acredito e espero. Em passo bêbado, acalmo as feras e peço além: raio de sol, verdade absoluta, felicidade inculta. Amar novamente. Amar pela primeira vez. Crer no impossível e no insensível. Ver o toque. Me embebedar no teu perfume. Ler, dizer, cantar. Gargalhar. Denúncia forte de sonho eterno, dorme menino. Acorda rapaz. Morre o que sempre foi: apaixonado. Vive em ode a um nome de novo. Atravessa as ruas. Corre. Pára. Pede um só minuto. Implora, interpela, enclausura. Bebe mais um gole do que viu. E é. Pede a voz. Acrescenta, multiplica, destrona e volta a entregar o cetro e a coroa. Miss Brasil. Em ode niílica ao amor de agora, escarnece. Ele é o grito de amor na praia de Copacabana. É a declaração. É o primeiro da fila. Aplaude de pé. Reverencia. Pede para amar.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Never More, Lenore


Desceu, perplexo, os degraus de outrora
Olhou, atento, o perpassar da hora
Vibrou, em tempo, a voz que ouviu lá fora
Achou, jumento, o som frio do ir embora

E viu, moribundo, que a morte já morreu
Pois fez, rotundo, um canto aqui no meu
Mostrou, no fundo, a voz que já chegou
Cresceu, imenso, o carrossel do afã

E fez, em vão, a prece de quem crê
Sonhou, então, com os olhos de quem vê
E ouviu, lá atrás, chamar quem sempre esperou
E abriu, lilás, a porta entrar o amor

Pois faz, e bem, quem ama sem pedir além
E diz, assim, que a flor nasceu em meu jardim
Mas traz, por trás, o canto de um trovador
Que mais que um ás, é jura de ser sonhador

Pois quem faz bem é vida pro amor também
Mas fiz, porém, as dores que vivi tão bem
Em voz, assaz, te digo como portador:
Me faz nascer, e sempre além acreditar

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

A pele em que habito


Lápides diversas, espalhadas por ilustres mausoléus, descrevem, funestas, as dores pérfidas das vozes que se foram. Gargalhadas na ceia de natal, enterro dos ossos, faca a destrinchar um tender embebido em óleo. Meio guardanapo. Quatro mãos se foram.

É o fim. Desprovidos de sofreguidão, correram mundo em busca de sossego. E desapego. E passaram-se tardes, noites e manhãs - especialmente as tardes, hoje solitárias nas salas de cinema - sem que dessem conta de que foi melhor assim. E se livraram de uma boa! Desolados, foram voz e vez nas madrugadas, monólogas madrugadas, nas maratonas ciclotímicas do sofrer e da saudade, embevecidos pelos beijos de outrora, pelas juras que se foram, as verdades vãs e as mentiras, estas bem verdadeiras, que ouviram e têm de ouvir até hoje.

Mesma voz, vê bem: de hoje em diante, cada verso terá um código de barras. Exprimirá, junto às letras, seus sabores e sofreres. Correrá pelas calçadas chuvosas, ouvirá muitas festas de criança, falará pelos cotovelos. E também pelos joelhos, cabelos e nossos dentes de mentira. Que não quebrarão! não há milho que os façam quebrar. E não partiremos. Veremos por aí, nas casas abandonadas e nas preces mal-contadas, cada floco de falta imensa e de desabafo. E quantas frases diremos? todas! E só uma. Ao fim das contas, só uma interessa.

Vide a bula, afirmo e dou nome aos bois. A surpresa da vida é acertar no milhar. Em vistas ao sonho, revisito o que sempre fui e jamais deixei de ser. O último. E, sempre do fim da fila, observo consciente que a entrega nunca é demais, ainda que num púbere sorriso. Que ouça a voz e sinta a palavra, hoje e sempre.

sábado, 12 de novembro de 2011

Graf Zeppelin


A força desvairada do devaneio pula no encalço da saltadora faminta. Espalha por aí, entrementes, que o surdo é marcação de seus passos não cumpridos. É canto de morte no uníssono do atabaque fúnebre, etéreo, que realça em sua voz o que é sem ter sido e o que nunca foi, mesmo quando o foi. Vê, embriagado de paixão, as doces retinas por trás do cristal e apronta, para ontem, dois ou três versos de amor para quem não sabe que existe. Ela é musa sem saber.

Todos os dias, escova a relva negra com a pressa dos imperfeitos e o pranto dos destemidos. Prepara o café. Lê, aflita, as dores que passou e ressoa, impune, o que sempre quis ser. Ela é a voz na imensidão. A palavra, o cavalo alado, a armadura. A boina cubana. A unidade.Pensa no mundo, na dor dos outros e no almoço das crianças. Faz treino-apronto.

Ouve, só, na neve d'alma que o vazio do inanimado é pura conversa para boi dormir. E entulha paixões, deserta nomes e os esquece, solene, na névoa infame dos que se perderam. A musa nem viu, nem se encontrou. Longe do clamor que seu nome causa por aí, mal sabe a nereida do torpor que faz trazer e da saudade, mandada, que aperta a aorta do poeta e faz a solidão palpitar. Trôpego pelas vielas dos que não têm, o equilibrista sufoca de sonho a palavra viva que aponta no dicionário e o faz assumir seu desejo maior, tão insolente quanto puro, de sentir-lhe rasgarem a alma e lhe observarem o avesso.

Pela eternidade, e mesmo quando não estava, o pierrô atravessou a rua sozinho. Interno de seus próprios anseios, sevicia-se no flagelo que é procurar a mão amada, não conseguir lhe mostrar o que representa e pedir pelos cantos um segundo de sua voz de framboesa. Que marche o pobre soldado, cabeça de papel, e que a musa ouça com a alma quem motiva as suas letras.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Mascarada

Desnuda a farsa, encantada. Se esvai em lágrimas e pensa em prole, por instante, em torpor de riso na face, olhos que brilham e voz que escorre, tão menina, pelo canto da mente. E crê, poente, que a máscara negra de outrora é pôster em branco e preto do carnaval que se foi. "Eu sou aquele pierrô que te abraçou, que te beijou, meu amor..." a velha imagem de sempre. O bobo apaixonado, em sua côrte, corteja e goteja seus pingos de sonhos e porventuras. Insone, se escalda, se esbalda, se deleita de pêssegos em calda. E afirma, solene: há de amar só mais uma vez. Só mais uma. Que seja a última máscara a tirar e a última face a beijar.

sábado, 5 de novembro de 2011

Pater Noster


John Do abriu o guarda-chuva londrino, amarrou os sapatos, anotou o horário, abriu a janela e pulou do décimo oitavo andar. Nevava em Swindon, Wiltshire. Jorge Henrique bradou aos ventos, vendou os olhos, pediu perdão e saltou. Morto, foi coberto por um velho jornal no campus da UERJ. Marina cortou os pulsos. Renata, os calmantes. Rita Hayworth, como Doña Sol em "Sangue e Areia", arrancou os dois olhos e pôs em uma jarra de suco de tamarindo. Lucas morreu. É, morreu. Só, sem drama, sem vela. E foi carregado, em uma noite de setembro, por oito dragões da independência, quatro de cada lado. Espadas na cintura, crinas engraçadas nos capacetes. Cavalos, banda marcial. Tiros para o alto. Estava enterrado o amor. Seus amigos o velaram, lágrimas nos olhos, com recato e compaixão. "Ela fez a maior besteira da vida dela", comentavam os emplumadores de pavão. Ele, também. Ao se entregar à morte em vida pelo amor de quem se foi, se fez rufião. Sim, rufião. Castrado. Todos os dias, ia até Duque de Caxias ou à esquina comprar pão com os olhos no chão e os pés, já naturalmente tortos, em uma humilde posição de convergência. Ambos apontavam para o centro. Foi o dia em que sentiu as batidas em seu caixão andante. Roxo, escaveirado e com a cabeça raspada, ouviu palavras de alento, sentiu pegarem-lhe as mãos e uma pontada qualquer de ânimo e renascimento. E se fez presente. De cada verso, insolente, mandou cartão-postal. Escondeu, retraiu, refletiu... e encontrou. Andarilho, quebrou as amarras de pinho que o prendiam ao além no alvorecer da vida. Fez manhã de sol, tarde de praia, noite de verbo. E cantou nas madrugadas quando, insone, repensou seu bem-viver. "Passa a viver por tua causa, ergue os braços e levanta essa cabeça, anda!", ordenou a voz amiga. E se tornou saltimbanco do amor para dar, passo trôpego de estupor e saudade, âmago de amizade e, eunuco que esteve, paixão seleta e proibida. Hoje, redivivo em suas posições e renascido em seus sentimentos, é brado bem diferente do de Jorge Henrique. É crença, espera e sonho. É certeza por aí. É chance, é pranto... mas, vivo está. E, em vida, será o que sempre foi: o cavaleiro errante que bate de porta em porta a procura do amor eterno e pranteia pelo som da chave desta vez.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Utopia



























Passo a passo na calçada, perpasso cada esquina no afã de me encontrar. Dádiva sofrida carrego e espero, atento, o teu retorno ou o teu pudor. Vejo com carinho e com saudade seus pés brancos, peço e despeço de tuas raras reinações. Trago, amofinado, tua dose de veneno. O teu dedo em riste, tua prova, tua causa. Tua utopia! Vê, serena, o quanto se ama por aí. Ralos tragos de paixão, juras falsas e descrenças. E cá, seleto, vejo a lágrima das íris castanhas escorrerem e pedirem por um novo amor... favor? Pede a quem te guia e escala solene e fria: sou menino ao teu lado com tua voz e utopia. Dá de cada mão uma prece, em cada gota de suor estremece, e cai de vez na tua cura. Me faz renascer. Afinal, sob o sol escaldante, uma linda história se passou. Dois mortos secos no deserto. Duas almas. Mesma crença.