quarta-feira, 25 de agosto de 2021

A verdade é que...

A verdade é que somos intransitivos

E vivemos a esperar o barqueiro

Para levar tudo o que há, corrente adentro

Para o mar aberto da nossa memória

Doces e amargos dias

Diapasões que ecoam até onde o som pode ir

Gargalhadas, beijos, prantos

Dias que vivemos, e que se esvaem para a Grande Nuvem

Nuvem inacessível, das perdas inexoráveis

Dias sofridos ou belos, não importa

Tudo está condenado a partir e me deixar aqui

Até o barqueiro vir me buscar

Mas, até o inevitável caminho

Ainda posso ouvir sua voz esvair

E me chamar, cada vez mais ao longe

Mas ainda sua, é ainda você

Que empalidece sem sair daqui

Como um decalque na janela

Que, mesmo rasgado e atirado de cima

Ainda mantém parte da sua cola

O que nos prende, o que nos marca

E o que me habita aqui, tão só

Para nunca mais. Para logo aqui.

Sem esperanças, mas inevitavelmente seu

Até que o vento do mar leve embora tua voz.

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