sábado, 9 de abril de 2011

Inferno Rubro

Em 31 de janeiro de 2008, há mais de três anos, publiquei neste mesmo espaço um artigo sobre a crise do America, que ainda sob a administração de Reginaldo Mathias patinava na Taça Guanabara e mostrava os primeiros sinais de que o rebaixamento era iminente. Na ocasião, o bom treinador Ademir Fonseca assumiu a equipe, trouxe atletas de sua confiança nas passagens por Cabofriense e Paysandu e não obteve bons resultados, graças á péssima disciplina tática de sua equipe e a uma preparação física deficiente. Reformulado o grupo, a pequena melhora na Taça Rio não impediu o primeiro rebaixamento em 106 anos de história. Em 2008, o America teve quatro treinadores: Ademir Fonseca, que vinha da Cabofriense e depois iria para o Bonsucesso, ambientado no futebol carioca e culpabilizado pelo rebaixamento pelo então presidente, o veteraníssimo Jorge Vieira, técnico campeão em 1960 e que assumiu na condição de interino, Amarildo, o possesso da Copa de 1962 e, finalmente, Gaúcho, hoje funcionário do Vasco, eterno bombeiro dos clubes de menor investimento. Não é difícil concluir que, entre Ademir e Gaúcho, houve um hiato. Amarildo, havia muitos anos fora do Brasil, não conhecia seus jogadores. E, muito pior: não conhecia seus adversários. Sua passagem foi a grande responsável pelo rebaixamento americano. Três anos depois, e após um retorno orquestrado pela boa vontade da FFERJ e da mídia na temporada de 2009, o novo rebaixamento. Afirma a velha máxima que errar é humano, mas insistir no erro é burrice. Repetir, temporada após temporada as mesmas falhas, soa proposital. Entrevistei no programa Esporte em Foco, da Rádio MEC, o então coordenador técnico do clube, Edu Coimbra, em dezembro. Ele havia assumido após o rompimento entre Romário e Paulo Gustavo, na época vice presidente de futebol. As perspectivas que o irmão de Zico me passou, apesar de toda a sua seriedade e comprometimento, foram as piores possíveis. Receitas de televisão antecipadas em 2010 para a disputa da Série D, saída da principal patrocinadora e recusa do clube em fechar com o BMG, o banco que patrocina todos os times e que até para o America fez uma tentadora proposta. Percebi o perfil da comissão técnica que Edu havia montado e logo concluí, antes ainda da montagem do elenco, que o propósito era montar um time com média de idade baixa, de 21, 22 anos. Para treinador, Gilson Gênio, havia muitos anos afastado do futebol profissional: esteve nos juniores de Fluminense e Duque de Caxias nas últimas temporadas. Os jogadores seriam selecionados em peneiras, tática perigosíssima no futebol atual. A razão é clara: quando se investe neles, tem de haver estrutura adequada para treinamentos e boa preparação física, pois a maior parte destes jogadores nunca as tiveram. O America não tem, e não teve nos últimos anos, nem uma coisa, nem outra. O fracasso era inevitável. O golpe político, com a troca de Paulo Gustavo por Antônio Tavares, velha raposa da política rubra, também. Saiu de cena a seriedade de Edu e retornou a postura dúbia de Romário, pouco interessado em ligar seu nome a um trabalho inteiramente fracassado. Comenta-se nos corredores da Campos Sales que o deputado federal pretende se candidatar à presidência do clube, o que o incompatibilizaria com o atual presidente, Ulisses Salgado. Como apoio, apenas foram mantidos os jogadores agenciados por seu empresário, como os atacantes Hugo e Wellington, que já estavam no clube. Retornaram os veteranos Arcelino e Bruno Reis, este último um dos poucos que se salvaram na campanha da Taça Rio. Contratados como referências da atual equipe, marcaram época em Botafogo e Fluminense por seus maus desempenhos. Com a saída de Gílson Gênio, assumiu Lulinha, sogro de Ronaldo Faria, ex junior do Vasco e irmão de Romário. Figura folclórica da Vila da Penha, foi preparador físico e treinador dos juniores do America no início dos anos 2000, levado por Seu Edevair. Venceu duas partidas, contra Americano, na Taça Guanabara e Cabofriense, na Taça Rio. As únicas vitórias do America no campeonato. Desgastado com as seguidas goleadas sofridas pela equipe rubra, deu lugar a Ademar Braga, gerente de futebol no início da gestão Ulisses Salgado e que havia muitos anos não comandava uma equipe profissional. Tal qual Jorge Vieira, Amarildo, Gilson Gênio e Lulinha, uma aposta que não tinha qualquer chance de dar certo. Os cinco foram apresentados aos jogadores do America no primeiro treino. Não faziam a menor idéia de quem eram, em quais posições atuavam e de suas qualidades e carências. Estavam fora do mundo do futebol profissional. E o pior: o clube foi devastado por seus adversários, que atacavam com toda a liberdade e não sofriam qualquer resistência por uma equipe que não era orientada a conter suas principais jogadas. Somente a três rodadas do fim, um irregular Marcelo Buarque, técnico de um bom trabalho no Duque de Caxias e dois maus, por Bangu e Macaé, assumiu a equipe e mostrou algum conhecimento sobre seus jogadores e adversários. Era tarde demais. Fulminado por mais uma derrota, o America Football Club é novamente um clube da segunda divisão do Campeonato Estadual, inchado em seus dezesseis clubes e que não verá, em 2012, um de seus mais antigos e tradicionais participantes. Desde 1987, o America repete erros e seus dirigentes beiram a insanidade. Há quem fale em insolvência e fechamento do departamento de futebol. Em um covil de raposas, em que todos querem embolsar os últimos tostões, realmente não há qualquer perspectiva de união em prol do clube. Por enquanto, o rebaixamento americano só nos deixa uma lição: futebol é para quem é do futebol. Apadrinhamento de quem vem de fora, em um meio tão competitivo, não pode ter outro resultado.