domingo, 30 de agosto de 2009

Pernas Para o Alto

Quero um colete crivado de balas
Quero a traquéia fechada, entala
Quero o bote furado no mar
Quero a tosse pulmão escarrar

Sangue que sangra, abriu a artéria
Sangue que corre, é pai da matéria
Sangue sem rubro, virou isquemia
Sangue perdura a tornar velharia

Rubro, circula por unhas e fios
Energiza a água e o sal
Embebe de açúcar a si mesmo
E traz a receita final:
Um bolo que Conde Vlad adoraria!

domingo, 16 de agosto de 2009

Na Madrugada

Pérfidos corvos da meia-noite. Atrozes vozes que perdoam o ressoar dos silenciados. Ouçam a voz dos perdidos: madrugueiros madrigais, sólidos como um jequitibá, esperam o barulho que faz o vendaval que bate nas paredes dos prédios. Aqui ao lado, a quadra de saibro encheu de poças d'água. Adoro o cheiro da madrugada. Cheiro de molhado com frio de molhado. Umidade pura. É na madrugada que absorvo as mensagens que minha mente traz e as faço ultrapassar meu metro e setenta através de um teclado preto. Depois da meia-noite, torno-me íntimo do poeta que me guia. É a voz do além, misteriosa conexão com o metafísico e que faz de mim um escritor. É só a voz. A voz da madrugada.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Preservativo

Ingresso de um show do Belchior em 1986. Entrada para um América x São Paulo do mesmo ano, Maracanã. Fitas de vídeo mofadas, nas quais só um fino rastro de imagens pontilhadas pode ser visto. Uma lata verde antiga de refrigerante, que encontrei certa vez durante uma escavação no quintal do meu avô. As revistas de mulher da minha avó. Corte e costura, prendas e dotes. No que é velho dou os botes. Vivo de colecionar quinquilharias, pedaços de papel, metal e pano daqui e dali. Nos últimos tempos, aderi à moda retrô dos clubes de futebol. Comprei todas. A mais bonita é a do Olaria campeão da Taça de Bronze de 1981. É a camisa 10 do craque Revélis, o "Anjo da Bariri". Vivo de abocanhar inutilidades. Porém, é com amor que assumo a posse de um mimo raro: uma película partida de reportagem da TV Continental, extinta no início dos anos 60. Deve ser a única no Brasil. Coleciono besteiras. Vivo das películas partidas, das camisas do Olaria e das latas enterradas por um cão qualquer. Coleciono borboletas mortas em 1880, jornais rasgados dos anos 40 e livros proibidos do século XVIII. Talvez um bom soneto do Bocage. Gosto das pedras quentes das saunas e de seu cheiro característico. Talvez, só elas, as pedras, me lembrem do presente. Logo as pedras! Tão antigas em sua imobilidade! Cada partícula é irmã mais velha de todas as invenções do mundo! Vivo agora de colecionar pedras. Afinal, antigas por antigas, são elas campeãs. Século que vem, eu prometo! Colecionarei as águas profundas dos oceanos com seus peixes grotescos e luminosos. Quem sabe eu monte um aquário de inutilidades, voltado especialmente para a preservação da memória animal. Será o Museu da Memória Animal. Ali, as tartarugas e papagaios oferecerão depoimentos de valor inquestionável. Que se tombem as pedras, as águas velhas e as tartarugas! Presevação do patrimônio natural já!

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Um Patacão e Quatro Vinténs

Eu aposto o meu posto que o desgosto tá aí. Nas colchas - duas ou três - que te cobrem, só vejo os olhos brancos quando abertos. Que frio, não? Com cinco graus, os cabelos começam a quebrar. Tornam-se dreads naturais. Daí aquela textura interessante do cabelo das siberianas, a qual observo diariamente na juba de minha amiga Elke Maravilha. Nestas horas, o "Rammal de Japery" é quase uma transiberiana. Os sapos e pererecas coaxam pelados no quintal de pedra, loucos por um matinho ou uma toca qualquer. Não há piscina para pular. Talvez, neste frio, até eles temam a água. A cama é de casal, mas o outro lado aí não está. Vira pro lado, vai! Admira o espaço vazio que há entre o corpo e a parede! Ligue a televisão, assista ao R.R Soares em um, dois, três, quatro canais ao mesmo tempo. Males da parabólica. Pensando bem, desligue a TV. Até Francisco Alves, fantasma ilustre da cidade, recolneu-se a um bom edredom feito de nuvem. E ainda me pede pra subir? Miguel Pereira é um pedacinho da Patagônia na serra!