terça-feira, 28 de abril de 2009

Mais Do Que Mil Imagens

Só quem vive é a palavra. Incerta, professa a dor e a glória de quem fecha portas para abrir outras. Aperta o peito a dor-saudade, invade a alma o medo aberto, esperta morte espreita ao teto. Há momentos em que o mal nos vê de cima. Espia a voz, nó na garganta, espanta a morte, esfria o pranto, Esparta à dor, espada-flor, espeta amor neste torpor! Nada há de mais vivo do que a palavra. Cada voz e cada letra são dores impressas no papel e na tela, testemunhas de vozes e estridos perdidos das almas afins. Sufoca a dor, dom da palavra! E força mais um dia bom...

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Sobre A Libertação

O português que por aqui aportou imaginava como mulher ideal a mourisca beleza das árabes, que por tantos anos dominaram as terras lusitanas e, por outros mais, travaram inúmeras batalhas contra a coroa portuguesa. Talvez venha daí a predileção brasileira pelas negras e morenas. As relações extra-conjugais subjugavam as normas matrimoniais da sagrada família de Lisboa quando esta se transpôs às terras tropicais do Rio de Janeiro, Salvador ou das Gerais. Deve ter sido o calor. O ardor das peles suadas e tostadas trouxe fervor pela alma feminina como o europeu jamais vivenciara. E o português descobriu que gostava de mulher. Por aqui, elas sempre tiveram papel muito mais importante do que em outras colônias. Levaram famílias no braço quando seus maridos, mortos de guerras ou de sonhos, não voltaram para casa. Foram prostitutas, militares travestidas de homens, imperatrizes, baronesas, amazias, cantoras, atrizes de rebolado, rainhas, princesas, infantas, herdeiras da fé e da dor de suas mães, que peregrinavam de véus negros pelas missas de domingo. As brasileiras, desde as origens, exibiram a predestinação para a ruptura. Se não lhes eram dadas as letras, tomavam a palavra e discursavam com o pouco que sabiam. Se as poucas letras não lhes bastavam, se tornaram protagonistas da luta pela universalização do acesso à alfabetização, ao entrarem em sala de aula como as nossas... professoras. Se lhes faltavam outras línguas, conviviam nas pensões e cortiços com as francesas fugidas de guerras e revoluções que aqui ganhavam a vida com diversões baratas como o canto, a dança e o sexo. Dividiam os varais também com as suas mães e avós portuguesas de tamancas, que em nada entendiam do apreço que nós, brasileiros, sempre tivemos pelo sexo oposto. Ah, as mulheres! Intrépidas e caudalosas, sempre curiosas, a sorrir por aí das conversas alheias. E tapam suas bocas com mãos, sorrindo com cuidado e atenção. Libertai-vos das amarras dos que jamais entenderam o seu papel de desnormatizar as normas. Afinal, regras para mulheres caíram muitas e outras cairão. Apenas o sorriso faceiro e dissimulado de todas elas permancerá impassível às mudanças trazidas pela pós-modernidade.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

O Susto Assusto

Pérfidas rotinas são as que reservam uma boa dose de parati em pleno café-da-manhã. A embriaguez matinal das trágicas lembranças faz da sebosa missão de aguardar um momento melhor uma espera interminável. É nestes aguardos que descobrimos o quão são importantes as boas companhias nos pontos de ônibus, filas do banco ou do cinema. O exercício perspicaz e lúcido da paciência traz um importante método de observação de nosso próprio cotidiano, como forma de construir alternativas mais eficazes e elaboradas, tornando assim cada espera um ato de proveitoso ócio criativo. É aí que me assusto com a necessidade de, o tempo todo, buscar mil possibilidades simultaneamente. A cada dia, nossas mentes funcionam como processadores. E, os informáticos sabem, processadores dobram de capacidade a cada seis meses. Assim como a tecnologia do processamento de dados atingiu o ápice da velocidade da transferência de informações, nossos corpos, mentes e almas já não mais podem suportar o peso hercúleo das obrigações pós-modernas. A embriaguez está aí. O torpor causado pela incessante demanda de compromissos colabora para a desconstrução do pensamento cotidiano, uma vez que o cotidiano inexiste com a necessidade de se agir diferente a cada segundo. Não há mais rotina. Quando pensamos de forma egocêntrica no ato alpinista de ser pós-moderno, estamos assinando o nosso atestado de liqüidez e efemeridade. Que não sejamos sempre seres embriagados. Um dia, a necessidade de viver em consonância com nossos princípios fará desnecessário o uso de máscaras e outros falseamentos. Neste dia, meus amigos, seremos devemos ser: nós por todo o tempo.

domingo, 19 de abril de 2009

Pecado Rasgado

Os atos pensados são sempre os mais rasgados. Teatrais, chorosos, exagerados. Desde pequenos, no chão nos debatemos em pedido ao desejado. Mesmo serenos, fazemos do sério um pedido. Pedimos em nosso blasè logo uma recompensa, e os outros que se dêem por satisfeitos com o nosso bom comportamento. Ao fim das contas, nos debatemos e esperneamos por todo o resto. Afinal, rasgadas e chorosas são todas as coisas que queremos, sofridos e perdidos são todos os bens que encontramos. Nada nos resta além de espernear pela própria sorte. Encontrem-a nas próximas lágrimas. Quem sabe não tropecem em uma pepita de ouro por aí.

sábado, 11 de abril de 2009

Negativo!

Todas as vezes em que a vida me pôs na berlinda, eu não a contestei. Sabatinado pelo desconhecido, trouxe a todas as respostas um bom porém. Obviamente, até outro dia, não havia tomado qualquer decisão, apenas possibilidades. O ato de tomar um caminho na estrada quando se faz necessário, com todas as suas desconfianças, é um ato corajoso. Através dele, para o bem ou para o mal, lançamos pedras fundamentais no chão gramado de nossas vidas, e fotografamos - dia após dia - o resultado das obras realizadas. Jamais seguimos o cronograma. Na grande empreitada do contrato, observamo-nos com pessoas, coisas e lugares que jamais esperamos. É ali, nas fronteiras do inusitado, que nos apresentamos ao ponto favorito de todos nós: as poucas certezas que temos, às quais nos apegamos como a última gota do cantil. Enfrentamos tantos dragões e tantos males o quanto suportarmos, nos aliamos a moinhos de vento e desabafamos com muros pichados por vândalos da Praça da Sé. É da vida seguir de pé. É sofrida a vida de quem só tem a última gota do copo de plástico azul, que se arrasta por sua superfície lisa e sintética com vagareza até atingir nossos lábios sedentos por um pouco de frescor. Refresca minh'alma, Isabela. Nos dias em que o asfalto derrete sob nossos pés, ao calor dos ovos fritos, nada há de mais certo do que o destino incerto. Já não sabemos mais para onde iremos. Nos foi negado o santo direito das certezas, das vitórias e alegrias e das dores e fraquezas. Somos todos blasé. Sem euforia, sem desespero. Somos médios por inteiro. O mundo é dos medíocres. Só não me deixem desgarrar de minha gota d'água. É ela, no fundo do copo, que renova o exercício do dom da vida a cada amanhecer. É ela, rainha dos clichês, que afaga minhas incertezas com uns bons poréns, tais quais os meus, e que me prometeu jamais dizer adeus.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

E Por Falar Em Amor: Onde Anda Você, Lucas Alvares?

Nunca vou me esquecer de um professor dos tempos de colégio que me trouxe uma enorme lição de vida: nunca se lê o mesmo livro da mesma forma. Quando lemos a mesma obra em diferentes períodos de nossa existência, descobrimos novos enredos e significados. Através deste exercício de interminável interpretação, observamos o quanto somos analfabetos de leitura. E não falo da leitura pura e simples, do beabá das letras da escola. Falo de ler os significados, compreendê-los e degustar cada resquício de bom passado que nos restar nos cantos dos pratos. Foi assim, relendo o que já li, que formei minha personalidade e a minha forma de enxergar o mundo em que nasci. 'Mas afinal de contas, não há nada tão presente nos seres vivos do que o tal do amor, que sempre transcende as barreiras do normal e do realismo...', como eu escrevi aos quinze anos. Hoje, aos vinte e um, decidi reler tudo o que eu mesmo coloquei aqui na web nos últimos sete. Redescobri uma infinidade de percepções dos quatorze, dos quinze, dos dezesseis, de sete Lucas, quinhentos sonhos, setecentas decepções e mil e oitocentos recomeços. Na realidade, me deparei com o que nunca fui, mas sempre quis ser: um escritor bem-sucedido que, aprisionado no endereço de um blog, encontra leitores carinhosos e participativos como os que tenho. A grande verdade é que nestes anos todos nada mais fiz do que refletir e amadurecer. Foi assim, seguindo em linha reta na estrada do sensível, que encontrei o pouco que penso que sou. Ali, naquelas milhares de linhas, imprimi meu principal anseio. Jamais deixar de amar. E amei muitas, e mais outras, amei meus avós, amei todos os que vieram por aqui e já passaram. Nas muitas noites de copos d'água, Sinatras e fotos bonitas, revelei pensamentos inspiradores aos que me liam com atenção. É esta, meus amigos, minha maior herança. Por um segundo, decidi me despedir dos velhos Lucas. Estes meus companheiros de jornada estão aqui, aposentados em meu guarda-roupa, prontos para serem histórias para contar. Um dia os desengavetarei. Por enqüanto, nos vinte e um, afirmo que sei bem o que amo. Amo todas as coisas que me cercam, ainda que me tragam preocupações e desgostos. Minha vida é uma úlcera na minha alma. Haverei de cultivá-la, com todos os seus sofreres. E, tal qual o personagem da mitologia grega, sempre haverá a noite para cicatrizar minhas feridas. É nela que faço o balanço de tudo o que já fiz, e constato que certamente já tenho bons recortes pra guardar.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Epitáfio

Aqui jaz pobre alma
A quem a dor não acalma
A quem a flor não encanta
A quem o amor não aventa

Aventa a sorte que espera
E espera a morte que herda
A fina flor da quimera
Que agüenta a vida austera

Aqui jaz azar profundo
Que vê tudo de errado no Mundo
Que vê tudo perdido no fundo
Que vê algo ferido de morte

Traga à morte boa sorte
A sete palmos do findo
Pois findo é algo profundo
Pois nele foi-se esse mundo