terça-feira, 6 de dezembro de 2011

O Que Será?

Um dia qualquer, luas minguantes atrás, duas doces vozes se abriram e, metálicas, ressaltaram o que eram: duas preces de amor eterno embebidas na acalentada esperança de um amanhã comum, infinito e intrépido. Os dois amantes, cansados das despedidas nas escadarias do metrô, foram mãos dadas por aí e noites passadas na rede, sob o russo da névoa gelada de algum lugar. Edredons beges, estampas de ursinhos, Mickey Mouse. No pé da boneca Marina, um "eu te amo". Até as tranças louras da boneca já sabiam: eram saborosos uníssonos as tardes de amor e dor no asfalto quente da Tijuca. Enclausurados em risadas e ventiladores, os dois contavam nomes de filhos e expiavam, em cada suspiro final, os pecados de outrora no mais puro e impávido dos sonhos. E foram quatro anos. Muitas luas, muitas mortes, muitos partos. E até os que não vieram. Beberam do azedume do tempo, marcaram a ferro em brasa suas iniciais, afagaram o peito um do outro com um acalento de sorte e de encontro. E bastava o silêncio. A mão pequena e seus três anéis, um em cada dedo, acariciavam o peito do amado e, sob um olhar sério nas íris castanhas, você prometia o seu amanhã. Só assim pra não sorrir. Se apertaram em carros, levaram vasos de flores pra lá e pra cá, arrumaram camas - muitas vezes! - e dedicaram um boa noite sereno, seja aqui ou acolá, para esperar em pranto a manhã seguinte em uma ensolarada Afonso Pena ou nas amendoeiras do Rebouças. E foram sorvetes, jujubas e doses de champanha. Nos tempos idos, de contar centavos, dividiram um saco de amendoins e uma lata de Coca-Cola. Ah, o teu sorriso! as revistas impudicas abertas em público, os teus palavrões, a tua falta de decoro. As minhas corridas contra o relógio. Os nossos beijos, os nossos planos, os nossos cantos... onde estarão os teus? E vi, noites atrás, as lágrimas descerem descontroladas e molharem as blusas na praça, mais uma, que testemunhou nossa dor maior. E a súplica, e a volta, e o triste fim. O teu ardil. As palavras dosadas, as mentiras contadas, meticulosamente contadas, os disfarces e impropérios. A minha morte em vida. Você me amou pavão. O afogou. Me abandonou pombo moribundo. E o despachou. Isso é detalhe no seu caderno carimbado. Ao me amar demais e não me ensinar a te esquecer, me fez calopsita aprisionada em uma gaiola de aço saudosa dos melhores dias que já vivi.