quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Chicago, Chicago...

Al Jolson, um russo radicado nos Estados Unidos, cantou a Chicago da Grande Depressão como poucos. Em um de seus maiores sucessos, bradou para que os microfones mecânicos pudessem captar que nenhuma cidade simbolizava o cotidiano do “crack” quanto ela. Na Chicago do início do século, nasceu o cartunista Walt Disney, acusado até hoje de ligação com grupos ultraconservadores, ao mesmo tempo em que suas empresas, oitenta anos depois, são vistas como instrumentos de erotização precoce. Chicago de Punky, a Levada da Breca, Chicago de Jordan, Pippen e Rodman – três negros – que encantaram o Mundo com o melhor time de basquete que viu jogar... Chicago da crise, do caos e de gente, muita gente. Gente por todos os lados, e muito calor. E nem faz tanto calor assim. Chicago é uma cidade abafada, com quase cinco mil habitantes por quilômetro quadrado. Foi na Chicago cantada pelo russo Jolson, pintado de negro para interpretar um cantor de jazz em Holywood, que surgiu para a política mundial um dos mais surpreendentes fenômenos eleitorais da história. Barack Obama, quarenta e sete anos, saiu do limbo político tradicionalmente reservado aos excluídos para a chefia da bandeira mais influente do planeta. Com mais de um milhão de moradores de Chicago sob os pés em um discurso histórico proferido em uma madrugada, Obama não é mais um branco de rosto pintado. Tampouco um filho das massas que busca no uísque, no golfe e nas bolsas de valores o carimbo da superioridade intelectual. Até agora, o novo presidente dos Estados Unidos é de coerência admirável. Pai de família correto, aparenta ser espirituoso e cortês com seus interlocutores. Tem em si mesmo uma fé que chama a atenção, e que foi capaz de derrotar os caciques democratas – todos eles por Hillary – nas convenções do meio do ano. Foi também de sorte incrível ao contar com a escolha da histriônica Sarah Palin, candidata a uma das mais folclóricas presenças políticas do milênio, responsável pelo tiro de misericórdia na campanha de John McCain. Sarah, o atraso de saias, “traiu” o eleitorado conservador ao permitir que uma de suas filhas se perdesse ao Mundo e engravidasse do namorado. E, pois, a musa-beata será avó de um filho de mãe solteira. McCain, veterano do Vietnã, representa o perfil de sempre. Ex-combatente, bem nascido, bem formado. Adepto indócil dos costumes “american way of life”. Excelente caráter, de acordo com seus conviveres. Porém, a representação republicana do que sempre foi feito. Feito e por anos eficaz. Porém, a depressão econômica que se avizinha, de efeitos tão imprevisíveis quanto Jolson e Disney imaginavam em 1929, pede um repensar quanto ao papel do Estado na economia. O personalismo político, fenômeno presente na eleição de Obama, volta com força total na medida em que se torna necessária a presença tentacular da máquina federal na busca de soluções para os problemas do cidadão comum, endividado e sem saber com que receita pagará suas contas no próximo mês. Em 32, o povo americano buscou no carismático Franklin Roosevelt, a personificação do capitalismo de Estado, uma forma de saciar o ronco do estômago. Hoje, quando bolsos, carteiras e contas amanhecem cada vez mais furados, o nome de Barack Obama parece ser o mais indicado para os desejos da classe-média norte-americana: um líder carismático que os guie à superação.

8 comentários:

Blog do Mario disse...

genial seu texto !!

Caiu a muralha republicana. Após os atentados de 11/09/2001, o mundo não foi mais o mesmo. Os Estados Unidos não serão mais os mesmos depois de 05/11/2008...e o mundo, de certa forma também.

Agora quem manda é o negão !!

Cah Rosa disse...

Estou estasiada pela oportunidade de ter vivido um momento histórico. Quarenta e quatro anos após a "abolição" da forma legal da segregação racial, um negro chega ao posto de chefe de estado. Obama não é só o líder do EUA, desponta para ser líder do mundo.

Críticas à parte, a América verdadeiramente é o lugar onde tudo pode acontecer.
Gritando entusiasmados "yes, we can!", os americanos depositaram sua confiança em uma esperança. Tiveram coragem de apostar no novo.

Anseio para que um dia, os brasileiros tenham a mesma coragem de acreditar na esperança.

Unknown disse...

Pois é meus amigos, parece que as vendas e as máscaras de algumas pessoas deste nosso Mundo estão caindo. O meu relato sobre o histórico dia quatro de novembro deste ano é simbólico. Acordei pela manhã do dia cinco e numa ansiedade cheguei à sala da minha casa para ver no jornal o resultado da eleição da maior potência mundial. Felizmente, logo na primeira página, vi a foto do homem que espero que faça com que mais máscaras e vendas deste Mundo de uma fantasia medíocre, hipócrita e preconceituosa possam cair finalmente. PARABÉNS OBAMA!Voltando ao meu simbolismo...achei neste jornal da elite, que recebo todos os dias em minha casa, uma caricatura do novo presidente dos EUA, recortei e colei no meu armário. No dia vinte de janeiro de 2009, essa caricatura se tornará real e aquele homem será o maior lider do planeta.Pura realidade!

fernando disse...

Obama não representa só uma ponta de esperança para o povo norte-americano que apostou na renovação. Parte do mundo também depositou todas as suas fichas em um nome, uma nova forma de política, quiçá em uma cor. A partir de agora, acertos serão comemorados "O negro realmente está dando certo"; erros serão exaltados "Apostamos na renovação e erramos". A vitória de Obama traz pra ele, e só pra ele, a responsabilidade de carregar o título de líder do mundo nas costas.

Luiz Domingues disse...

Torço muito para que seja um bom presidente. Entretanto é preciso se lembrar que suas maiores qualidades declaradas por aliados e simpatizantes são: ser jovem e negro. Qualidades que garantem a ele um lugar na história sim, é verdade. Mas que não são garantia de que será um grande presidente.

Após ser taxado como o Salvador da Pátria, Obama só tem duas saídas: a glória (significa mudar o mundo, o que não é fácil... nem para ele), ou o fracasso de ser um homem de carne e osso.

Unknown disse...

Histórico, simplesmente histórico. Estamos presenciando uma época que, com toda certeza, estará em páginas e páginas de apostilas escolares dos nossos filhos e netos. A mudança finalmente começou a acontecer, e do melhor jeito, partindo do país que, bem ou mal, querendo ou não, manda no resto do mundo. É esperar pra ver. ;]

Unknown disse...

Muito bom.. gosto muito dos seus textoos =D

Isabela de Sousa disse...

Como disse o Luiz "... é preciso se lembrar que suas maiores qualidades declaradas por aliados e simpatizantes são: ser jovem e negro. Qualidades que garantem a ele um lugar na história sim, é verdade. Mas que não são garantia de que será um grande presidente." Boa sorte, Obama! E "Yes, YOU can" (change the history)!