sábado, 24 de abril de 2010

E o Coração? Lá...



Assopra com gosto o bolo de cinco anos, pequena. Seus cabelos pretinhos, tais quais os meus, esvoaçam à guisa da brisa da praça do Leme. Cá, dez amiguinhos festejam a filha d'eles dois. Rostos meigos de imberbe ingenuidade, sem os traçados riscados pelo tempo - ainda que breve. Alvíssaras e claques celebram o fruto do nosso ventre, o rebento de nossos desaires. Desalinhamos lá atrás, esperamos mesmo assim o futuro como bons partners e assobiamos, juntos, na espera de um porém. Não o encontramos. Sem poréns, pusemos nossos pés lado a lado e caminhamos sem carro nem moto por uma estrada de areia e lama. Almas pantanosas. Passaram-se tantos anos... O que é festejar um filho? É vermos, felizes, o sabor da missão cumprida em uma união de mais dissabores do que festejos. Não me venha com gracejos. Hoje é só um dia nosso. Nosso e de nós três, com as almas na praça e a peça encenada do futuro que ainda não vi.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Pancadas num Quarto Escuro














Basta! Besta de quem vê além o mal que se tem cá mesmo. Vê assim, meu jasmim, o quão ressentido é o amor que se perdeu no córner do tempo. Passou tal qual poeira a dobrar a esquina, a procura de um ralo para rodopiar ao lado dos cabelos perdidos de alguém. Redemoinhos de pavor. Afoguei-me em caldo de dor, narinas tampadas, boca a urrar um grito abafado pela força da água: tirem-me daqui! Quero voar sozinho sobre as lagoas sujas, pousar nas hóstias dos padres e mentir ao palavrório desconexo das vozes dissonantes. Basta! Veja bem, meu jardim suspenso foi cancelado: obra de mil anos, parou nos primeiros cem, quiçá um pouco menos, nem sei ao certo. Nosso reino verde das samambaias de salão se perdeu com um fusível queimado três horas atrás. Apagou-nos a luz. Prometeu dar-lhe de novo, acaso o caso valer. Valei-me! Vê cá bem, meu jardim de jasmim, não dá para ser cerejeira em flor sem que tu creias em meus queixumes. Sinto saudades de teus perfumes, de todos, e de tuas bossas alegres. Desejo teus olhos verdes com o ardor dos sapatinhos de cristal. Ou seja, sem ardor algum. Que sejas retrato na porta do meu armário. Amém.