sábado, 5 de novembro de 2011

Pater Noster


John Do abriu o guarda-chuva londrino, amarrou os sapatos, anotou o horário, abriu a janela e pulou do décimo oitavo andar. Nevava em Swindon, Wiltshire. Jorge Henrique bradou aos ventos, vendou os olhos, pediu perdão e saltou. Morto, foi coberto por um velho jornal no campus da UERJ. Marina cortou os pulsos. Renata, os calmantes. Rita Hayworth, como Doña Sol em "Sangue e Areia", arrancou os dois olhos e pôs em uma jarra de suco de tamarindo. Lucas morreu. É, morreu. Só, sem drama, sem vela. E foi carregado, em uma noite de setembro, por oito dragões da independência, quatro de cada lado. Espadas na cintura, crinas engraçadas nos capacetes. Cavalos, banda marcial. Tiros para o alto. Estava enterrado o amor. Seus amigos o velaram, lágrimas nos olhos, com recato e compaixão. "Ela fez a maior besteira da vida dela", comentavam os emplumadores de pavão. Ele, também. Ao se entregar à morte em vida pelo amor de quem se foi, se fez rufião. Sim, rufião. Castrado. Todos os dias, ia até Duque de Caxias ou à esquina comprar pão com os olhos no chão e os pés, já naturalmente tortos, em uma humilde posição de convergência. Ambos apontavam para o centro. Foi o dia em que sentiu as batidas em seu caixão andante. Roxo, escaveirado e com a cabeça raspada, ouviu palavras de alento, sentiu pegarem-lhe as mãos e uma pontada qualquer de ânimo e renascimento. E se fez presente. De cada verso, insolente, mandou cartão-postal. Escondeu, retraiu, refletiu... e encontrou. Andarilho, quebrou as amarras de pinho que o prendiam ao além no alvorecer da vida. Fez manhã de sol, tarde de praia, noite de verbo. E cantou nas madrugadas quando, insone, repensou seu bem-viver. "Passa a viver por tua causa, ergue os braços e levanta essa cabeça, anda!", ordenou a voz amiga. E se tornou saltimbanco do amor para dar, passo trôpego de estupor e saudade, âmago de amizade e, eunuco que esteve, paixão seleta e proibida. Hoje, redivivo em suas posições e renascido em seus sentimentos, é brado bem diferente do de Jorge Henrique. É crença, espera e sonho. É certeza por aí. É chance, é pranto... mas, vivo está. E, em vida, será o que sempre foi: o cavaleiro errante que bate de porta em porta a procura do amor eterno e pranteia pelo som da chave desta vez.

Um comentário:

Felipe Matano disse...

Que seja uma reencarnação repleta de felicidades! Assim será!